Semana começou praticamente de madrugada. Aula das 8:30 era com o "Mad Max" (apelido do Bazerman, que dispensa explicações...) e seriam nossas duas últimas aulas do curso de negociação. Mas para a negociação das 8:30 começar, era preciso mais ou menos uma hora de preparação, razão pela qual o café da manhã começou as 7h da madrugada com os parceiros do "trio" de negociadores.
Basicamente, a atividade consistia numa negociação envolvendo a venda de apisódios de uma série de televisão para uma rede privada. A negociação era bastante complexa, com uma série de variáveis a serem negociadas e, obviamente, com assimetria nas informações disponíveis para os dois lados.
Meu grupo tinha, além de mim, um indiano VP de uma rede hoteleira daqui dos EUA e um Sul-Africano diretor de banco. A negociação foi dura e interessante. Rolou até stress, com o outro grupo ameaçando levantar pra ir embora, e eu que não levo desaforo pra casa (e obviamente apoiado nos dados que eu tinha de que eles precisavam do que estávamos vendendo) dizendo pra que, já que eles estavam com tanta vontade de ir embora, que fossem (e eles foram!!!!). Mas no fim, chegamos a condições razoáveis pra ambas as partes (mais razoável pra eles, mas não foi de todo mal pra nós) e fechamos o acordo. Pra ser objetivo, lições aprendidas:
- Por mais informações que as partes tenham, dispor de um bom negociador é fator crucial. Este comentário pode parecer estúpido de tão óbvio, mas não é bem assim. No nosso caso, eu fiquei cuidando do notebook e das contas e simulações, o indiano (visivelmente um profissional mais senior) e o Sul-Africano assumiu o papel de interlocutor e, portanto, de principal negociador. Mas no desenrolar da negociação, esta decisão mostrou-se equivocada, já que ele esteve o tempo todo inseguro e vulnerável à agressividade do negociador do outro lado da mesa (que era extremamente competente, diga-se de passagem). Isso foi determinante para que eles obtivessem um resultado muito mais favorável do que nós. Por exemplo, quando retornamos à mesa depois do quebra-pau, definimos a proposta com a qual o nosso negociador deveria abrir novamente as conversas, mas ele foi de tal forma engolido pelo outro negociados que a hora que ele começou a falar já estava iniciando 10% abaixo do que a gente tinha definido!
- Nunca sabemos de verdade as informações que a outra parte tem em qualquer negociação. E a recíproca é verdadeira. E obter essas informações, depende sobremaneira de ouvir mais do que falar e, principalmente, fazer as perguntas (esse negócio de fazer perguntas está em toda parte por aqui...);
- Nem sempre o tamanho do bolo de uma negociação é fixo e pré-definido. No caso em questão, haviam duas variáveis em jogo as quais, dependendo da negociação, poderiam destruir e jogar no lixo alguns milhões de reais em função do valor percebido (e respectivo impacto na lucratividade e perspectiva de ganho) de cada parte. E a chave para entender que algo assim está acontecendo é construir confiança a partir do fornecimento de informações para a otura parte. A maioria dos grupos entrou em processo de contraposição (ao invés de colaborar) e um valor significativo foi destruído dessa forma;
- Ofertas contingenciais são ótimas para identificar blefe. História rápida pra exemplificar: numa negociação, um comprador americano adquiriu quantidade significativa de um intem de um vendedor asiático e o contrato chegou a tal ponto de detalhe que especificou que a mercadoria deveria vir de navio, no navio "X". Logo após o fechamento do acordo, o governo americano estabeleceu um embargo àquele país, e a partir de uma data determinada o navio ficaria impossibilitado de desembarcar nos EUA. O comprador ligou pro vendedor e pediu para que o frete fosse feito por via áerea e pediu que o vendedor pagasse o frete, já que o país dele estava sob embargo. O comprador disse que o americano era estressado e que ele deveria ficar tranquilo porque o navio chegaria a tempo de desembarcar. O Americano, então, sugeriu a seguinte "proposta contingencial": o vendedor mandaria a mercadoria por via aérea. Enquanto isso, ambos rastreariam o navio. Se o navio chegasse aos EUA a tempo de desembarcar a mercadoria antes do embargo, o Americano pagaria o frete aéreo e ainda enviaria um pedido formal de desculpas. Se o navio não atracasse a tempo, o vendedor assumiria o frete. O vendedor não topou, alegou que o contrato estava ficando muito complicado e sugeriu rachar o frete. O que podemos inferir? Que o vendedor estava blefando e nunca acreditou verdadeiramente que o navio chegaria ao destino há tempo, já que se acreditasse, não teria nada a perder aceitando a proposta do comprador!
- Em negociações difíceis, fazer múltiplas ofertas para a mesma coisa pode ajudar. Por exemplo, imaginemos que o valor máximo para iniciar uma negociação seja USD 10 milhões. Fazer 3 propostas com condições diferentes, ainda que as 3 no frigir dos ovos correspondam aos mesmos 10 milhões (mudando condições, prazos e outros aspectos), pode não ajudar a fechar o acordo em um primeiiro momento, mas pode dar sinalizações do que é mais importante (tem mais valor, portanto), para a outra parte a partir da manifestação do interlocutor sobre a proposta que menos o desagradou!
E assim, com o debrief do case da rede de televisão, fechamos a participação de Mad Max e encerramos o segundo módulo do programa (o primeiro foi finanças e contabilidade).
Começamos a tarde com Marketing e o caso da Signode Industries, uma indústria de insumos e ferramentas para embalagens. Difícil traduzir o que eles fabricam porque não conheço os temros em portugues, mas é algo como fitas metálicas para empacotar containeres e paletes da indústria, com as respecitvas embalagens. O caso tratou do padrão de atuação de uma indústria que atua em mercados de commodities. Particularmente, no caso, a indústria em questão atuava num mercado que proporcionava diferenciação mas que caminhava rapidamente para um mercado apoiado em guerra de preços sem espaço para provimento de serviços como diferencial.
Em mercados commoditizados, uma das únicas formas de evitar guerra de preços (algo que deve, efetivamente, ser evitado a todo custo) é desenvolver uma cultura de "fluxo contínuo de vantagem insustentável". Em outras palavras, criatividade e velocidade para manter um constante processo de inovação em processos que seguramente serão copiados pelo cliente (por isso são insustentáveis), mas que asseguram diferencial ainda que de curto prazo. Inovação contínua! Além disso, outras defesas contra commoditização passam por gestão de lucratividade de clientes (isso envolve até mesmo escolher que clientes você deseja servir e que clientes você quer, simplesmente, "dispensar" para não comprometer a lucratividade) e por estrutura de preços não-transparente (para que seus competidores não possam compreender sua estrutura de custos e para que o cliente não possa fazer comparações diretas).
Finalmente, fechamos o dia com um case de finanças, mas que foi bastante interessante (por mais difícil que possa parecer um "case de finanças interessante"... hehe) sobre o desenvolvimento do A380 da Airbus. O bacana é que as coisas vão efetivamente se conectando, e por exemplo, para avaliar as perpectivas de retorno sobre o brutal investimento necessário para o projeto do A380, antes de começar a calcular os números, é preciso avaliar o mercado (marketing), as razões para desenvolver o projeto (Estratégia, já que a Boeing, por dominar o mercado de aviões grandes com o 747 sem concorrente, podia lucrar enormemente neste segmento e vender os aviões menores praticamente subsidiados... pra se ter uma idéia, a margem de lucro da Boeing nos 747 era de 20% a 25%, enquanto a margem de lucro da cia como um todo era de 5% a 6%... ou seja, os aviões grandes respondem pela lucratividaade e os pequenos são vendidos com prejuízo para assegurar market share), os aspectos regulatórios e de incentivo dos governos de Europa para a Airbus) e dos EUA para a Boeing (BGIE - Busines, Government and International Economy), os avanços tecnológicos necessários para viabilizar o projeto (Inovação e Efetividade Organizacional) e a viabilidade do processo de produção propriamente (operações).
Um caso complexo e cujo desenrolar basicamente reside na diferente visão das duas cias. Enquanto Airbus acredita num mercado concentrado em hubs centrais que depois distribuem passageiros a partir de aviões gigantes (as chamadas VLAs - Very Large Aircraft, para mais de 500 assageiros) a Boeing aposta num mercado distribuídos com ligações ponto a ponto feitas por aviões menores e mais eficientes (e a parte bacana é ter um engenheiro da boeing no grupo, o que aumenta mais o interesse por permitir uma visão de dentro da cia). Interessante também os moviementos gerados nos mercados de ações provocados apenas por alguns anúncios. Por exemplo, quando a Airbus decidiu ir adiante com o projeto do A380 (um projeto no qual a Boeing coperou no início, mas decidiu abandonar em função da sua visão do futuro deste mercado, que já descrevi acima), a Boeing decidiu que não invetiria no desenvolvimento de um 747 "esticado". Entretanto, quando a Boeing começou a ver a Airbus recebendo um monte de pedido pro novo avião, no final de 96 eles anunciaram que avançariam no projeto do novo 747 esticado, o que fez as ações despencarem (o mercado entendeu que era um movimento que demandaria muito investimento e corroeria a lucratividade da Boeing) e a cia perder $ 0,9 bilhões em valor. Alguns meses depois, no começou de 97, a Boeing anunciou que havia novamente desistido da inciativa, e o mercado reagiu valorizando as ações da Boeing, o que aumentou o valor de mercado da cia em $ 2.3 bilhões. Esse movimento foi tão intensivo que alguns analistas chegaram a sugerir que a boeing parasse da fazer aviões e começasse apenas a fazer... comunicados!
Outra coisa interessante: a Airbus tinha que provar ser capaz de evacuar 850 pessoas de dentro do A380 em 90 segundos. Sim, é isso mesmo... 850 almas tendo que sair do avião em um minuto e meio em caso de emergência, e, de acordo com os padrões internacionais, com metade das portas do avião sem abrir!!!!! Pois bem, em quanto tempo você acha que eles conseguiram? A resposta é 77 segundos! Documentado em vídeo e mostrado em sala de aula... em 1 minuto e 17 segundos, 850 pessoas saíram do airbus escorregando por aquelas esteiras de emergência que parecem um escorregador gigante.
O resumo da ópera é que a Airbus conseguiu viabilizar o projeto contando com financiamento pesado dos países europeus participantes do consórcio (UK, França, Alemanha e Espanha) e dos fabricantes de componentes, que toparam financiar o projeto em troca de exclusividade no fornecimento dos componentes. Entretanto, as projeções feitas foram extrapoladas em todos os aspectos (no custo e no prazo para lançamento), a Airbus adotou práticas muito agressivas para conseguir pedidos (cortando o preço de lista em 40%, por exemplo, o que impacta diretamente o break-even, já que os cálculos do número de aeronvas que deveriam ser vendidas para empatar o projeto e transformá-lo em gerador de valor foram feitos com o preço de lista) e a situação ficou bastante complicada, resultando no afastamento do seu CEO. Hoje as perpectiva são boas (já existem vários A380 voando, embora com atraso de entrega de dois anos), mas o break-even vai demorar MUITO pra ser atingido. O curioso é que a Air Singapore responde por certa de 70% dos pedidos de A380 já feitos (a lista de pedidos na posição de FEV deste ano é de 202 encomendas do A-380, contra 108 do 747 esticado, que a propósito, a Boeing retomou novamente). Enquanto isso, a Boeing investe mais pesadamente no 787 Dreamliner, que por sua vez também postergou seu vôo inaugural, que ocorreu em dezembro do ano passado, em quase dois anos. e será um marco no história da aviação comercial (segundo palavras do Gregg, meio suspeito, mas tudo bem...) pela inovação em materiais que vai permitir um avião mais leve, mais eficiente, com maior alcance e maior nível de conforto para os passageiros. O mercado parece estar acreditando, já que no mesmo report de fevereiro a Boeing tinha 876 pedidos para o 787.
Amanhã, em Marketing, discutiremos relacionamento com clientes e estou relativamente surpreso com informações que li nos textos que já tivemos que ler hoje de que, por exemplo, cerca de 55% dos projetos de CRM não são bem sucedidos, e 1 em cada 5 são tão tuins que chegam a prejudicar o estabelecimento de relações de longo prazo com os clientes. E um levantamento feito pelo Quelch hoje em sala de aula parece comprovar esta tese: 2/3 do grupo de AMPs disse que não seria capaz de, em 24 horas, conseguir identificar quem são os 150 clientes mais lucrativos de suas respectivas organizações. 2/3 do grupo é muita coisa, principalmente se lembrarmos que estamos falando do nível de empresas que estão representadas. É pra se pensar...
Outra coisa que esqueci de comentar antes: apesar de todos os fabulosos recursos audiovisuais disponíveis nas salas de aula, os quais já descrevi, todos os professores, sem exceção, continuam usando intensamente o bom e velho quadro negro (tudo bem que são uns 18 na sala que sobem e descem num apertar de botões...), o bom e velho giz (sendo o destaque neste departamento o Rivkin, que faz verdadeiras obras de arte nas suas aulas com giz multicolorido) e, o mais impressionante... as boas e velhas transparências com retro-projetor. Mas penso que é isso mesmo... esse negócio de muito firula, apresentação com movimento pra lá e pra cá, letra piscando, imagem rodando e assim por diante, é coisa de quem carece de mais CONTEÚDO e precisa disfarçar usando essa parafernália audio-visual... hehehehe
PS.: Apenas para evitar mal-entendido, o pessoal que me conhece sabe que a ironia do comentário acima foi endereçada a mim mesmo, já que em geral, minhas apresentações são exatamente como descrevi acima... ;-)
2 comentários:
Ebaaa!!! notícias frescas!!! Mais uma aula!!! Legal o estudo de hj. Vou complementar com um pouco de his´toria. Semana passada assisti um doc sobre o A380, a genialidade dos engs no desenvolvimento de soluções para tornar real a aeronave. E no doc, mostrava o desenvolvimento do sistema para inflar os tobogãs para atender as normas de segurança de aviação. Isso aí que vc comentou dos 90 segundos. É impressionante. O legal no doc, pra quem curte física, foi ver a solução adotada no trem de pouso. O maior problema era amortercer as 560 toneladas da aeronoava+carga a uma velocidade de 300 km por hora (sei lá se é isso, pode ser que seja mais), continha básica massa x aceleração, dá pra imaginar a força necessária pra frear o trem, sem destrui-lo? A sacada dos engs foi, usar o trem de pouso com sistema de bomba para encher pneu de bicicleta, parece piada. É bem simples a concepção, o trem de pouso são cilindros com água ou óleo, quando o avião aterrisa a pressão realizada nos cilindro aciona uma válvula de escape que faz com que o fluido seja liberado, reduzindo circunstancialmente o impacto na aeronave. E os tobogãs de ~40m deveriam inflar em 6 segundos, e os caras conseguiram acho q foi 3s.
bom é isso!! Sobre suas aulas com efeitos pirotécnicos, lembre, o dificil é simplificar!!!
Sobre a guerra das negociações. Citei num dos blogs anteriores um case meu de um curso/workshop o qual paguei o dobro do valor de outros do mesmo "título" no mercado. Este curso entitulá-se Customer Centric Selling (CCS mais uma sigla) e esta metodologia é utilizada por, por exemplo, a Microsoft. O core do curso é exatamente fazer com que o cliente perceba o valor do que ele está comprando (nã do que vc está querendo vender) e para isso temos (os vendedores) que construir vários cenários que identifiquem este valor inclusive com cases de de sucesso de outros clientes. Um outro ítem importantíssimo desta metodologia é a abordagem da negociação que exige, exatamente como voce falou, que criemos alguns cenários de negociação que permitam o dar e receber entre os negociadores evitando ao máximo, ou melhor, nunca levando, o desconto para a mesa de negociação e as vezes até declinando da negociação caso não consigamos deixar claro o valor proposto ao cliente.. Só falta praticar mais hehehe... Alguém quer uma softwarezinho baratinho aí???
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