sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Dia 32 - Sexta - 08/10

Começamos o dia a todo vapor estudando Supply Chain Management utilizando o caso de Li & Fung, uma companhia fundada em Hong Kong durante a dinastia Ching, em 1906, cujo grande diferencial era a capacidade do fundador de falar inglês (além de Chinês, é óbvio), numa época em que quase ninguém na China dominava o idioma. Assim, o negócio começou oferendo itermediação para compradores do Ocidente mediante uma "módica" margem de 15%. Como a evolução do mundo e a ascenção dos Tigres Asiáticos, ficou difícil segurar margens elevadas apenas para fazer intermediação e a situação se complicou. Os dois netos do fundador, que à época estavam em Harvard (um dando aulas, outro fazendo MBA), foram chamados para salvar a empresa e, até aqui, estão indo muito bem, obrigado.
 
 
Eles modificaram a estrutura do negócio em 3 passos (parece receita de bolo... hehe). Primeiro, expandiram o seu alcance geográfico e se tornaram um agente  regional de intermediação - e não mais apenas em Hong Kong. Começaram a operar com fornecedores de Taiwan, Coréia e Cingapura. O segundo passo consistiu na sua transformação em um gestor de cadeia produtiva. Em outras palavras, eles começaram a se envolver no que os clientes necessitavam (indo além, portanto, de apenas "tirar pedidos") e começaram a colaborar com o processo de criação e definição do que os clientes necessitavam, indo atrás de fornecedores para atender. E, finalmente, levaram o modelo ao limite no terceiro passo, tornando-se um fabricante virtual geograficamente disperso (nome bonito!). Basicamente, eles fracionaram a cadeia de fornecimento em tantas partes quanto possível, e baseando-se em estratégias criativas, conseguiram assegurar que ordens colocadas pelos clientes sejam produzidas e entregues em 5 semanas, com a produção de cada componente sendo feito em um local específico onde o fornecedor tem a melhor qualidade e o mehor preco. Assim, um casao, por exemplo, pode ter a parte externa fabricada na China, o forro interno em Taiwan, o zíper no Japão, os botões na Coreia, e ser montado em Hong Kong. Ou seja, ao invés de "made in Hong Kong", passar a ser "made BY Hong Kong".

Este é o modelo de produção que está dominando o mundo. Por isso, é inútil resistir contra algumas coisas, é melhor "surfar a onda". A produção está e continuará sendo concentrada na Ásia. É tão mais barato e eficiente que justifica, por exemplo, movimentar um container pela Ásia entre os diferentes produtores em diferentes paises para depois despachá-lo para a Europa, ao invés do velho modelo baseado apenas em quantidade. Esta é uma mudança brutal do parâmetro, porque nos acostumamos a imaginar que para trabalhar com a Ásia, tudo teria que se baseado em um container, no mínimo, para cada tipo de produto. Hoje, não mais. Posso encher um container com vários tipos de produto, fracionando-o. Portanto, o desafio para muitos dos produtores no ocidente é entender como tirar proveito e surfar esta onda. O que, aliás, tem muito mais a ver com agregar valor para o cliente. Por exemplo, a competência essencial de um produtor de moda deve estar e efetivamente criar a moda (design) e estabelecer relações próximas com os clientes. Como diz o Presidente do Conselho do Sebrae, Jefferson Nogaroli, "fabricar, eh força. vender é arte".

No caso da Li & Fu, imagine o valor agregado pelo produtor para o cliente. Ao reduzir o tempo de produção entre o pedido e a entrega para cinco semanas, eles reduziram sobremaneira o tempo necessário para que os clientes (varejistas) façam seus forecasts. Agora, ao invés de trabalhar com 2 grandes estações, eh possivel trabalhar com 8 ou 9 por ano. Além disso, com a redução do tempo para planejar a demanda, as perdas por produtos encalhados são infinitamente menores.

Li & Fung gerenciam uma cadeia de fornecimento com 12.000 fornecedores espalhados por mais de 40 países, predominantemente na Ásia, mas também na América, na África e na Europa (a lógica é simples: usar o melhor e mais competitivo na cadeia de fornecimento, independente da localizacao física). Existem fornecedores, por exemplo, nos Eua (San Francisco), Honduras (San Pedro Sula), Portugal (Oporto), França (Paris), Bélgica (Bruxelas), Romenia (Bucareste) Turquia (Istanbul), Cairo (Cidade do Cairo), Ilhas Mauricio, Indonésia (Jakarta), Malásia (Johor Baharu e Cingapura), Tailandia (Bangkok), Sri Lanka (Colombo), Índia (Nova Delhi, Bumbai e Bangalore), Paquistao (Karachi), Bangladesh (Dhaka), Vietnam (Hanoi), Filipinas (Manila), Saipan (uma ilha no meio do Pacífico), Taiwan (Ttaipei), Coreia do Sul (Seoul), Coreia do Norte (Dalian) e finalmente, China (Zhanjiang, Guangzhou, Changsha, Shantou, Liuyang, Nanjing, Shanghai, Qingdao, Beijing e Dalian). O bacana é que o case serve também como aula de geografia! :-)
 
Outra característica interessante da empresa é o fato de que os diretores tentam, a todo custo, manter uma estrutura emoreendedora. A essência é a filosofia do "pensar como uma grande empresa, agir como uma pequena empresa". Esta prática é de extrema importância, já que um dos diferenciais competitivos dos caras é a velocidade, e como sabemos, grandes empresas geralmente não são um exemplo de velocidade. Assim, a estrutura permanece bastante informal e o modelo de remuneração é o mais direto possível. Ao invés de trezentos tipos de benefícios que significam custos para gerenciar (carros da empresa, assistência médica, ajuda disso, auxilio daquilo), tudo é traduzido em grana no bolso, e cada um que gerencie seu dinheiro como achar melhor. A remuneração também é diretamente ligada a resultado (incentive driven company). O componente variável é tão grande quanto possível e é espalhado pela empresa de forma tão abrangente quanto possível. A remuneração e a gestão dos recursos humanos não obedece um conjunto de práticas corporativas e, ao contrário, é desejável que obedeça a diferentes padrões em diferentes lugares do mundo. E, finalmente, eles estruturaram a empresa "em torno do cliente", ou seja, cada cliente tem uma célula de trabalho efetivamente trabalhando pra ele (envolvendo pessoas de criação, produção, pessoas de vendas, logística, etc), e cada uma dessas células é independente. Ou seja, como são centenas de clientes,  é como ter centenas de pequenas empresas , com estrutura própria de resultados, ao invés de uma única grande empresa. Além disso, este tipo de estrutura permite mante a tradição secular da empresa de relacionamento próximo e intimidade com o cliente, já que cada unidade de negócios cuida de apenas um cliente. Ou seja, une-se a tecnologia que pemite aperfeiçoar a caceia de fornecimento ao "old style" de proximidade com o cliente. Ainda, nessas unidades de negócio, os colaboradores tem enorme autonomia e possibilidade de improvisar para suprir  necessidades do cliente. Entretanto, onde liberdade em excesso não é desejável (controles financeiros e contábeis, códigos de ética e conduta), os processos são totalmente centralizados e sem possibilidade de grandes "invencionices". É a partir destas coisas que eles definem a Li & Fung como uma grande empresa autenticamente empreendedora.
 
Isto posto, apresenta-se a reflexão: um modelo organizacional como este, com remuneração traduzia em dinheiro líquido, descentralizada, centenas de unidades autônomas, não-padronização das políticas de reumneração adaptando-as a cada local, e etc., poderia funcionar numa grande empresa brasileira? Até que ponto um modelo como este está ligado a cultura? E ainda, quais as alternativas para fabricantes locais competirem em um mercado como este? 

Na sequência, discussão de questões éticas envolvendo uma firma de serviços financeiros e o dilema de lançar ou não no mercado um produto com o qual a concorrência estava roubando clientes, mas que tinha tudo para ser percebido como um produto lesivo (em termos de taxas de juros extorsivas) no longo prazo. Algo similar ao que muitas "financeiras" que a gente conhece aí no Brasil fazem, cobrando taxas exorbitantes para empréstimos de curto prazo da população de baixa renda que não se dá conta de que quando anualizadas e compostas, essas taxas passam dos 3 dígitos por ano. No Brasil é normal, aqui dá discussão ética. E o melhor, a tal empresa lançou o produto e o retirou do mercado um ano depois exatamente pela má repercussão que o produto estava provocando junto ao mercado e aos clientes.

À parte toda a discussão que foi bastante longa (ética chega perto de religião, política e time de futebol, todo mundo tem uma posição "apaixonada" a respeito), Healy apresentou alguma pesquisas interessantes. Por exemplo, uma pergunta do tipo "A produção de alface numa determinada cidade sofreu uma calamidade como uma tempestado de granizo e faltou alface. Um produtor tinha alface plantada numa área que não foi atingida pelo granizo e, como faltou alface, resolveu aumentar o valor da alface em 40% já que estava faltando. Você entende que esta atitude é justa ou não?", foi apresentada a grupos de pessoas separados em "alunos de AMP", "alunos de MBA" e "pessoas comuns". Nesta e em todas as outras perguntas similares (aumentar preço do saco de areia na eminência de um furação em Miami é outro exemplo) o gráfico de respostas parecia uma escada, com AMPers respondendo que a atitude de aumentar o preço é correta em 80%-90% das vezes, MBAs ficando entre 60%-70% e a população em geral ficando muito abaixo, na casa dos 20%-30%. Daí, concluí-se que quanto maior o nível do cidadão com decisões corporativas que envolvem questões mercadológicas e econômicas, menor sua predisposição para se sensibilizar com causas fora das leis que regem o mercado. Mas, apesar disso, o que dá "alguma esperança" pra esse mundo cão, é que várias outras pesquisas mostram algo que parece que o mundo corporativo finalmente está aprendendo: sucesso a longo prazo somente se sustenta quando é baseado em atitudes éticas e quando a empresa convence os clientes de que eles efetivamente podem confiar nela.

A má notícia é que a aula do Kaplan que seria hoje foi cancelada e ficou pra segunda-feira. O curioso é que foi cancelada porque ele teve um problema de mau tempo e não pode voar a partir de onde ele estava na data prevista. Onde ele estava???? No Brasil (São Paulo)... :-D

3 comentários:

Anônimo disse...

Nosso blogueiro, case man, filósofo e escritor favorito. Muitooo bomm!! Vários aspectos. O primeiro do ranking: a bendita da cultura! Esse caso dos chineses, a empresa é um organismo vivo. Cheio de células, organelas, mitocondrias, e tudo q tem direito. Mas sempre precisa de um cerebro.
Sobre, a ética. Como pode variar tanto a percepção das pessoas. Com o passar do tempo as pessoas vão fechando o angulo de visão e só passam a ver o que as interessa. Em função disto, se depreciam outros conceitos sociais importantes: os valores. E dá pra ver no seu texto que quem consegue abrir o campo de visão, ao invés de ver mais longe é possivel ver mais oportunidades e isso possibilita ir mais longe!!!

Anônimo disse...

que sacada essa sua de incluir os marcadores, outro dia tava procurando um texto muito legal, q vc havia postado sabe lá quando, fiquei uma era procurando... aproveitei pra ler mais uma vez outros posts...
muito legal!!!!
abçs
Ana Haesbaert

Allan Costa disse...

Ana e anonimo, obrigado pelos feedbacks. Imaginei que com o blog crescendo, ia comecar a surgir aquela coisa "onde foi que eu li mesmo?"... aih botei o indice por palavras chave, o que, penso eu, deve facilitar!!!! Abraco!